Pode até ser que o consumidor demore a perceber, mas, a partir do próximo sábado, os rótulos de algumas cervejas começarão a ficar diferentes. Será quando passará a valer a Instrução Normativa nº 65/2019, que estabeleceu o novo padrão de identidade e qualidade (PIQ) da cerveja.
Os novos parâmetros a serem seguidos pelos fabricantes criam a classificação de cerveja com teor alcoólico reduzido ou com baixo teor alcoólico, que deve ficar entre 0,5% e 2%. Além disso, acrescentam a definição de cerveja gruit, o que possibilita a substituição do lúpulo por ervas. E, principalmente, permitem a inclusão de matérias-primas de origem animal e de outros ingredientes de origem vegetal na cerveja.
Também há outras definições, como a de que a “tradicional” cerveja, aquela que possui 2% ou mais de graduação alcoólica, deve ter ao menos 55% de malte, enquanto as que possuem menos precisam levar o nome do adjunto acrescentado. Ainda há determinações sobre a cerveja puro malte e a sem álcool ou desalcoolizada, que não pode ter graduação alcoólica superior a 0,5%.
Porém, as novas normas de identificação das cervejas não serão vistas necessariamente nos rótulos a partir de sábado. Afinal, as cervejas produzidas ou fabricadas até a próxima sexta-feira não precisam necessariamente atender ao novo PIQ, podendo ser comercializadas até o fim de seu prazo de validade.
Inicialmente previsto para entrar em vigor em 2020, o PIQ da Cerveja teve a sua implementação adiada em um ano em virtude da pandemia do coronavírus, que causou impacto nas vendas, com as marcas ficando com muitos rótulos antigos. Esse adiamento foi lembrado pelo presidente da Federação Brasileira das Cervejarias Artesanais (Febracerva), Marco Antonio Falcone, como uma conquista importante para o setor, que teve mais tempo para se adaptar.
“A postergação em se aplicar a IN-65 demonstra a sensibilidade com o segmento, que sofreu pesado com as vendas durante a pandemia, afetando diretamente os estoques de rótulos e afins, e demonstra ainda diálogo com o segmento através da Câmara Setorial da Cerveja”, afirma Falcone
Inovações e adequação internacional
Para André Lopes, diretor jurídico da Associação Brasileira de Cerveja Artesanal (Abracerva) e colunista do Guia (https://guiadacervejabr.com/category/colunas/coluna-advogadocervejeiro/), o novo PIQ melhora a identificação e acompanha a evolução da indústria e as suas inovações nas últimas duas décadas, considerando que a normativa anterior estava em vigor desde 2001.
“Um exemplo de inovação que a nova regra traz é a possibilidade de denominar cerveja o produto elaborado com ingredientes de origem animal (mel, por exemplo), que antes eram consideradas bebidas alcoólicas mistas. Outro avanço significativo foi a criação da cerveja com teor alcoólico reduzido, classificação que antes não existia”, explica o Advogado Cervejeiro.
O Sindicato Nacional da Indústria da Cerveja (Sindicerv) acredita que o novo PIQ pode, inclusive, ser um catalisador da criatividade das marcas na definição das receitas dos seus próximos rótulos.
“A medida também traz inovações como a permissão de inclusão de matérias primas de origem animal e outros ingredientes de origem vegetal, dando possibilidade de novas receitas aos nossos produtos. Uma das maiores características do setor cervejeiro é a criatividade – a cada ano vemos inovações para agradar o paladar de nossos clientes”, avalia o sindicato.
O Sindicerv, além de apontar que a medida é modernizadora, avalia que o PIQ da Cerveja está em consonância com a legislação adotada internacionalmente. “Os novos padrões adotados buscam um nivelamento com outros países, de modo que o consumidor brasileiro tenha à sua frente tantas informações quanto teria em qualquer outro país cervejeiro. Os métodos analíticos da Convenção de Cervejeiros da Europa – EBC (European Brewers Convention) passarão a ser expressamente adotados aqui, no que se refere a análises de rotina e de referência, o que faz bastante sentido já que a cerveja é uma bebida global, assim como várias de nossas cervejarias.”
O estímulo à inventividade também é destacado pelo advogado Clairton Kubaszwski Gama, sócio do escritório Kubaszwski Gama Advogados Associados, como fator positivo do PIQ da
Cerveja, especialmente para as marcas artesanais.
“Embora tenham gerado algumas discussões, principalmente quanto ao limite para uso de adjuntos, de forma geral as modificações realizadas no PIQ da cerveja podem ser vistas como benéficas ao setor, especialmente para o segmento artesanal. Reivindicações antigas, como a possibilidade de utilização de adjuntos de origem animal (mel, por exemplo), padronização das informações de rótulo e simplificação do processo de registro de novos produtos, foram atendidas”, argumenta Clairton.
Já o sindicato que representa a Ambev e o Grupo Heineken no Brasil acredita que o PIQ da Cerveja acompanha uma tendência de mudança na preferência do consumidor. “Exemplos dessa evolução no gosto do consumidor, que deverão ganhar ainda mais força nos próximos anos e ficarão mais fáceis de se visualizar na rotulagem, são as cervejas light, sem glúten, sem álcool e até mesmo as de puro malte”, analisa o Sindicerv.
E, na visão do diretor jurídico da Abracerva, a medida também é benéfica para o consumidor, que passará a ter mais clareza sobre as características da cerveja. “A associação avalia que as mudanças serão muito benéficas, principalmente para o consumidor, que entenderá melhor o que está bebendo, já que os rótulos antigos causavam muita confusão e desinformação no público, e o novo PIQ melhorou muito isso”, garante André.
Possíveis punições
O advogado lembra, ainda, que quem não atualizar os rótulos de suas cervejas e os registros dos produtos do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) corre o risco de ser multado. “A utilização de rótulo em desconformidade com as normas legais vigentes é passível de multa no valor de R$ 2.000,00 até R$ 117.051,00 (art. 108 do Decreto Nº 6.871/2009)”, alerta André.
Já Clairton destaca que, em alguns casos específicos, a punição pelo descumprimento do PIQ da Cerveja pode ser ainda mais severa. “A fiscalização, que fica a encargo tanto do Mapa quanto do Inmetro, e ainda de órgãos de defesa do consumidor, poderá aplicar sanções que vão desde advertências até multas. Em alguns casos, pode haver até mesmo a proibição de comercialização da cerveja ou, ainda, a cassação do registro do produto ou da própria cervejaria”, completa o advogado.
Fonte: https://guiadacervejabr.com/piq-da-cerveja-muda-rotulos-setor-avalia-norma/